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Público latino cresce, quebra recordes e muda a indústria de cinema dos EUA

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O filme mexicano “Não Aceitamos Devoluções” chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (3) após bater recordes e fazer barulho nos Estados Unidos. Escrito, dirigido e estrelado por Eugenio Derbez, celebridade na TV do México, o longa faturou US$ 44 milhões (R$ 98 milhões), tornou-se o quarto longa estrangeiro mais rentável da história e deu um recado claro a Hollywood: o público latino é a principal força do mercado doméstico.

No momento em que a indústria cinematográfica norte-americana vê aumentar sua dependência das bilheterias internacionais, agradar à crescente população latina é uma das principais estratégias para tentar melhorar a arrecadação dentro de casa.

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Segmento populacional que cresce mais rápido nos EUA, os hispânicos representam 17% dos moradores do país e caminham para chegar a 30% até 2050. Em 2013, foram responsáveis por cerca de 25% da compra de ingressos de cinema, de acordo com pesquisa da Motion Picture Association of America.

Além disso, os latinos vão mais ao cinema (6,4 vezes ao ano, contra 4,1 vezes da média geral dos norte-americanos), alugam mais filmes e consomem mais entretenimento em tablets e celulares: 47% fazem streaming de vídeos ao menos uma vez por semana, contra 25% de não hispânicos, segundo dados da PricewaterhouseCoopers divulgados em maio.

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Acrescente-se a esses números o crescimento do poder de compra dos latinos, que deve chegar a US$ 1,6 trilhão (R$ 3,5 trilhões) em 2015, e não é de se espantar que Hollywood tenha começado a se mexer para tentar entender o que querem os hispânicos.

A Lionsgate, por exemplo, se uniu ao Grupo Televisa para criar a Pantelion Films, empresa dedicada a produzir e distribuir filmes latinos. A Universal criou uma equipe de “marketing multicultural” e outros estúdios ampliaram gastos com publicidade, além de tentar inserir elementos da cultura hispânica em seus produtos.

0d8skptf2o4y30zme7knnhg8b-5055021 Jason Merritt/Getty Images

O mexicano Eugenio Derbez fez sucesso com ‘Não Aceitamos Devoluções’

Muitos filmes escalaram latinos para o elenco, como Michael Peña em “Marcados Para Morrer” e Michelle Rodriguez na franquia “Velozes e Furiosos”, ambos sucessos de bilheterias, enquanto “Toy Story 3” teve frase em espanhol inserida no roteiro e “Atividade Paranormal: Marcados Pelo Mal” foi ambientado em comunidade hispânica da Califórnia.

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 O canal de streaming Netflix também investe na produção de séries para latino-americanos, com versões dos filmes “Um Drink no Inferno” e “Nosotros los Nobles”, de Robert Rodriguez e Gary Alazraki, além de “Narcos”, seriado do brasileiro José Padilha que terá Wagner Moura como o traficante colombiano Pablo Escobar.

Homem por trás de “Não Aceitamos Devoluções”, Derbez se considera um exemplo do maior interesse de Hollywood pelos latinos. O sucesso do filme o fez trocar o México pelos EUA e suspender os planos de tirar férias por um ano.

“Minha vida mudou completamente”, conta, em entrevista ao iG. “Estou morando e trabalhando em Los Angeles porque muitos estúdios querem alcançar a plateia latina. E meu filme mostrou que isso é possível, desde que tenham o produto certo.”

Embora tenha se surpreendido com a repercussão de “Não Aceitamos Devoluções”, Derbez diz que sempre acreditou no potencial do longa. “Assisto aos filmes de Hollywood há anos, e eles erram muito quando querem representar os latinos. Eles não nos conhecem.”

Criminosos e mulheres sexy

A principal derrapada dos filmes hollywoodianos é lançar mão de estereótipos, geralmente representando os latinos como criminosos, traficantes, profissionais mal pagos ou pouco qualificados e mulheres sexy.

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O elenco da série ‘Devious Maids’, exibida nos EUA pelo canal Lifetime e criticada por reforçar estereótipos na representação de latinos

Em junho, estudo da Universidade de Columbia que analisou os dez filmes de maior bilheteria de 2010 a 2013 mostrou que 19,1% dos personagens latinos eram policiais ou militares e 17,7% tinham alguma ligação com o crime. Além disso, mulheres hispânicas interpretaram 69% das empregadas domésticas mais famosas de filmes e programas de TV desde 1996.

“Não há nada de errado em ser babá ou jardineiro, e nós realmente fazemos este tipo de trabalho. Mas é preciso um equilíbrio, mostrar que também somos advogados, juízes, médicos”, afirma Alex Nogales, presidente da National Hispanic Media Coalition, organização que desde 1986 pressiona estúdios e emissoras a melhorar a representação de latinos.

Derbez afirma que, nos EUA, 95% dos papéis que lhe foram oferecidos eram de “jardineiros, cozinheiros, ladrões ou traficantes”. Para ele, parte do sucesso de “Não Aceitamos Devoluções” está no fato de o protagonista ser um homem comum, que trabalha como dublê, tem medo de compromisso e precisa crescer quando uma ex-namorada deixa um bebê em sua casa. “Muita gente disse ter ficado feliz em ver, na tela, um latino que é um cara legal, bom pai e bem-sucedido, mesmo sem falar inglês”, conta.

Foco na família

Sem violência ou nudez, “Não Aceitamos Devoluções” foca principalmente na forte relação entre pai e filha e adota um “tom família” que é considerado crucial para conquistar o público latino. Fãs de terror, ação e animação, os hispânicos gostam principalmente de filmes que podem ser vistos por todas as idades: 86% consideram ir ao cinema importante para passar mais tempo com a família e os amigos, de acordo com estudo da Nielsen de 2013.

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‘Pulling Strings’, outro filme mexicano que foi bem nas bilheterias norte-americanas em 2013: público latino vai ao cinema em grupos

“Nossa cultura é a de levar todo mundo ao cinema: a mãe, o filho, a avó. De repente, o exibidor não está vendendo apenas um ingresso, está vendendo seis”, explica Rick Najera, ator, produtor e diretor mexico-americano, autor do livro “Almost White: Forced Confessions of a Latino in Hollywood”.

Para ele, ainda é cedo para saber se o fênomeno “Não Aceitamos Devoluções” facilitará a produção de mais filmes em espanhol nos EUA. Segundo ele, os latinos ainda têm dificuldade maior do que outros grupos para “ter acesso ao capital”.

“Sempre que um filme faz sucesso, fica mais fácil para os estúdios nos darem dinheiro. Mas se um não faz, eles já não sabem se querem investir de novo. Hollywood é um comprador assustado, que sempre quer ter certeza de que nada vai dar errado. O cenário ainda é frágil.”

Por trás das câmeras

Se está cada vez mais de olho no consumidor latino, a indústria cinematográfica norte-americana está longe de realmente incluir os hispânicos no processo criativo.

Os dados da Universidade de Columbia apontam que, nos dez filmes mais vistos entre 2010 e 2013, os latinos representaram 2,2% dos produtores, 2,3% dos diretores e 6% dos diretores. Mais importante: apenas um dos 53 executivos dos principais estúdios, emissoras de televisão e rádios é hispânico.

Os números se mantiveram na mesma ou até pioraram nos últimos 70 anos, num claro descompasso entre Hollywood e a mudança demográfica em curso nos EUA.

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Com Will Ferrell, ‘Casa de Mi Padre’ (2012) tentou conquistar público latino, mas foi mal nas bilheterias

“Os latinos querem ver sua realidade multifacetada refletida nos filmes, e isto requer o envolvimento, em frente e atrás das câmeras, de mais pessoas com ampla e real experiência sobre seu mundo”, afirma Clara Rodriguez, professora de Sociologia da Universidade de Fordham e autora de “Heroes, Lovers and Others: The Story of Latinos in Hollywood”. “Em particular, precisamos de pessoas nos cargos que dão sinal verde aos filmes.”

Najera concorda: “Há uma história social que precisa ser contada por nós. Adam Sandler e Jim Carrey nunca saberão lidar com estas questões, porque não são questões deles.”

História universal

Para os estúdios, o desafio é criar filmes que atraiam tanto os latinos quanto o restante da população, algo conhecido como “crossover”. A tarefa é difícil, mas foi alcançada, por exemplo, pelo humorista Tyler Perry, autor de filmes voltados à comunidade negra que conquistaram público amplo.

Derbez disse ter se esforçado para fazer de “Não Aceitamos Devoluções” um filme atraente a qualquer pessoa. “Sempre que pensávamos em uma piada muito local, eu a jogava fora. Sabia que não podia fazer humor para mexicanos, tinha que pensar em algo que funcionasse nos EUA, na América Latina e em qualquer país.”

Para Najera, é possível aproximar os valores dos hispânicos e dos norte-americanos, ambos bastante tradicionais. “Um filme que agrada a uma família no interior dos EUA pode agradar a uma família mexicana na Costa Oeste e a uma família cubana em Miami”, afirma. “É preciso buscar a história universal, mas com um sabor latino.

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