Pouco mais de meio século depois, a retomada das relações comerciais entre Cuba e EUA também terá reflexos no Brasil. A dúvida é se estes impactos serão mais positivos ou negativos para o país que, nas palavras da presidente Dilma Rousseff, desejava ser “aliado econômico de primeira ordem” da ilha caribenha.
Especialistas consultados por ZH divergem: há quem diga que as exportações brasileiras poderão crescer diante do possível fim do embargo americano e consequente aquecimento da economia cubana, mas há quem acredite na possível perda de mercado. Afinal, se o vizinho resolve mudar a postura e ser cordial, qual a razão de bater em portas mais distantes?
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Para o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, o Brasil poderá ter prejuízos, pois vai passar a competir diretamente com os EUA, que tem a vantagem de estar mais perto da ilha:
— A operação envolveu uma série de condicionantes, possivelmente — não deve estar escrito, mas é implícito — que Cuba deve procurar, na medida do possível, comprar coisas dos EUA. É como dizem: não existe almoço grátis. E isso preocupa quando a gente olha a pauta de exportação do Brasil para Cuba, porque é exatamente o que o EUA também exporta.
Ex-embaixador brasileiro em Washington, Rubens Barbosa, presidente do Conselho de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), afirma que a medida terá um impacto limitado em um primeiro momento e que o efeito imediato é político. Segundo ele, os reflexos econômicos dependem do fim do embargo, que precisa ser aprovado pelo Congresso americano. Embora o presidente Barack Obama venha enfrentando forte oposição, Barbosa acredita o embargo deverá cair devido à pressão interna motivada pelo interesse de vender produtos agrícolas para Cuba:
— Do ponto de vista político, foi uma vitória da diplomacia brasileira e de todos os países da região que há décadas vinham considerando um equívoco esta política americana.
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Entre os otimistas, está Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comercio Exterior entre 2007 e 2011. Ele estima que o fluxo comercial entre Brasil e Cuba poderá crescer 50% nos próximos cinco ou 10 anos. Sócio da Barral M Jorge Consultores Associados, Barral lembra que o país vem estreitando relações com a ilha há sete anos já antevendo essa abertura econômica:
— Há 10 anos, Cuba começou um processo de reforma econômica e, com a saída do Fidel (Castro), começou a permitir investimentos estrangeiros, mas ainda é uma economia muito controlada pelo Estado. O Brasil pode se beneficiar disso porque já tem investimentos importantes em Cuba.
O consenso entre os especialistas é que, para a ilha, a retomada das relações comerciais com os EUA é quase como a conquista da liberdade condicional. A medida, avaliam eles, é benéfica para a economia cubana, que vinha enfrentando crises, e abre a perspectiva de atração de investimento estrangeiro, o que não ocorria devido ao temor de sanção americana.
Apesar das críticas quanto à falta de transparência, o financiamento do porto de Mariel, que recebeu cerca de US$ 800 milhões do BNDES, também é visto agora como uma decisão acertada, que deverá ter como reflexo o desenvolvimento da região. Para o professor de Relações Internacionais da UFRGS Paulo Vizentini, com a possibilidade de aumento no volume de negócios, o investimento “será mais realista, terá mais razão de ser”:
— O Brasil já abriu oportunidades de negócios. Se economia cubana melhorar, como deve acontecer, vai haver mais oportunidade de negócios. Então, quem já está lá dentro, já conhece melhor os mecanismos e funcionamento da economia, creio que pode tirar algum proveito.
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