As biografias de jogadores de futebol alertam que não é fácil deixar a base de um grande clube e ingressar no profissional sem encarar desconfiança. É preciso provar a cada treino, jogo, minuto. Como se fosse último. No caso de Luan no Grêmio, a torcida de todos é de que as partidas jamais se acabem. Que haja sempre mais. Porque o meia-atacante de 20 anos conserva o raro predicado de se superar a cada desafio. Time B, jogos de Gauchão e, por fim, Libertadores. Primeiro, fora, na pressão do Parque Central, uma perfomance segura no 1 a 0 sobre o Nacional-URU. Nesta terça, no conforto da Arena, o pulo do gato. E com gol, que abriu o 3 a 0 sobre o Nacional de Medellín, seu primeiro na equipe principal, que fez, enfim, o Grêmio se declarar à promessa.
O momento abençoado de Luan começa a praticamente obrigar jogadores, técnico e dirigentes a saíram da cautela tradicional ao comentar sobre um jovem valor que surge. Diminui-se o arsenal de termos como “é cedo” e “vamos aguardar” e avolumam-se expressões de flagrante otimismo. A mais emblemática partiu do diretor executivo de futebol Rui Costa.
– Para jogar como está jogando, o Ramiro precisa dar carrinho, o Riveros precisa correr feito louco. Mas, é claro, se trata de um jogador evidentemente diferente. Tem qualidade técnica diferente dos demais adversários e certamente vai evoluir. O torcedor pode ficar tranquilo, o Grêmio tem a maior fatia de seus direitos (80%) e tem um contrato que o protege. Não estamos pensando em vender o Luan agora. Antes de sair do Grêmio, vai nos dar um grande título – disse Rui, em entrevista após a partida na Arena.
Até o comedido técnico Enderson Moreira se abriu um pouco mais. E projeta mais crescimento ao jogador:
– A cada partida ele está adquirindo mais confiança. Tem personalidade, não se esconde, aparece, vai errar ainda, mas ele tem bom preparo das equipes de base. Está conquistando espaço. Tenho convicção de que vai crescer muito.
O crescimento é evidente. É o jogador que mais atuou no ano, sendo os três primeiros compromissos com o time B, treinado por Marcelo Mabília. Lá, havia feito seu único gol até então, diante do Brasil de Pelotas. No total, coleciona ainda duas assistências e dois pênaltis sofridos. Na vitória sobre o Novo Hamburgo no sábado, saiu aplaudido de pé da Arena.
Nesta terça, mostrou que poderia ainda mais. Além da atuação intensa de sempre e da ovação na substituição, aos 39 minutos do segundo tempo, adicionou em seu menu o primeiro gol pela equipe principal. Aos 28 minutos, quando antecipou-se ao impedido Riveros, salvando o lançamento de Ramiro e abrindo o placar. Aos microfones, ainda muito tímido, Luan é um poço de simplicidade e humildade.
– Eu não me considero titular. Quando precisarem de mim, estarei à disposição. Foi uma vitória com gostinho especial, meu primeiro gol na Arena. Que seja o primeiro de muitos.
Início no futsal, culto e videogame
Luan Guilherme de Jesus Vieira deu seus primeiros passos na carreira aos 15 anos, como atleta da equipe de futsal do Rio Preto, na sua São José do Rio Preto, no interior paulista. Passou para o futebol de campo somente em 2012, pelo Tanabi, equipe profissional, na Série B-1 do Campeonato Paulista. Meses depois, defendeu o América-SP. Foi recrutado pelo Grêmio, que venceu fortes concorrentes, quando estava na Catanduvense, em 2013. Veio num pacotão, com Cairon e Guilherme Amorim, este último seu colega de quarto até três semanas atrás, quando Luan finalmente se mudou para um apartamento.
Mora sozinho. Deixou a mãe em São Paulo, a faxineira Márcia Cristina de Jesus, que sempre fez força para o menino franzino realizar o sonho de jogar como o ídolo Ronaldo Fenômeno. Luan inicialmente era centroavante. Passou pelo projeto de evolução técnica chamado “Lapidar” e virou meia-atacante no Grêmio. Ou melhor, virou a vida no Grêmio. Só não mudou antigos hábitos. Como ir ao culto evangélico, de preferência acompanhado por Guilherme Amorim. Outro costume: jogar videogame. E, agora, mais recentemente, a rotina que mais o interessa: acumular atuações vistosas vestido de tricolor.
Fonte:G1