ORANGE COUNTY, CA (BDCi) — No primeiro ano em que eu e meu marido moramos aqui aqui não tínhamos carro. Em Orange County isso é um problema, porque aqui sem carro você não vive — tudo é feito para esse tipo de transporte (pistas grandes, freeways e estacionamento para tudo quanto é lado), e o transporte público aqui é bem fraquinho. Há apenas ônibus e, ainda assim, esse serviço é bem limitado — é impossível chegar em alguns pontos da cidade, a não ser que você esteja disposto a andar um tempão para conseguir chegar lá. Por conta disso, o início da nossa vida aqui foi um pouco complicado. Tarefas do dia-a-dia, como ir ao mercado, eram difíceis, e passeios no final de semana eram raros.
Depois de um tempo conseguimos comprar um carro — mais liberdade, finalmente!, eu pensei. Agora posso descobrir o mundo, eu pensei. Com a empolgação toda eu estava esquecendo de um pequeno detalhe: eu não sabia dirigir.
Foto: Gabriela Gusman Klafke
Eu não terminei de tirar minha carteira de motorista no Brasil, finalizei apenas o processo de moto — eu nem acredito que andei de moto uma época, um perigo ambulante. Apesar de ter feito umas aulinhas de carro, já fazia um tempo e eu não lembrava mais de nada. A saída, então, foi procurar saber como fazia para tirar a carteira de habilitação aqui na Califórnia.
Tirando a carteira de motorista na Califórnia
Foto: Google Images
O Detran daqui se chama DMV (Department of Motor Vehicles). O site deles é muito bem estruturado e você consegue fazer bastante coisa por lá, como marcar horário para fazer provas e/ou exames, pagar taxas, registrar veículos, etc. Foi lá também que eu encontrei todas as informações sobre o processo para tirar a carteira de motorista (chamada aqui de driver’s license). Para tirar habilitação na Califórnia, você precisa:
Ler atentamente as informações iniciais para new drivers
No site do DMV eles explicam que caso você esteja apenas visitando a Califórnia e já tenha carteira de habilitação válida em seu estado ou país, não é necessário tirar outra por aqui. Caso você esteja aqui para morar — como foi o meu caso –, é preciso, sim, tirar uma nova (ou inédita, para mim) carteira de motorista. Se você já tiver habilitação de outro país, ela é válida por apenas 10 dias depois da sua chegada na Califórnia.
Agendar uma visita ao DMV
O agendamento pode ser feito pelo site e é bem simples. A única parte ruim é ter que esperar tanto para conseguir um horário — a data mais próxima que eu encontrei foi para dali a um mês.
Demorou, mas chegou! Lá fui eu ao “Detran” daqui.
Nessa primeira visita você vai precisar dos seguintes documentos:
- tirar suas digitais;
- tirar uma foto;
- apresentar seus documentos legais (passaporte, por exemplo) e seu Social Security Number (caso não tenha um, como eu, explicar porquê não tem);
- agendar sua prova teórica
Minha primeira ida ao DMV foi bem tranquila. Fiz todas essas coisas que citei acima sem maiores problemas e a fila estava andando rápido. Tenho só uma observação: como no Brasil, alguns servidores públicos aqui estão SEMPRE de mau humor, então não espere simpatia e sorrisos de ninguém. Talvez você dê sorte e encontre alguém “feliz” para te atender, mas geralmente o povo no DMV é um pouquinho bruto.
Foto: Life Hacker
Marquei minha prova para dali a uma semana. Não precisei fazer aulas teóricas porque sou maior de 18 anos (apesar de algumas pessoas duvidarem). Não é uma maravilha?! Aqui você não é obrigado a passar pela tortura daquelas aulas e gastar um dinheirão; meu bolso e meu tempo agradeceram imensamente. Porém, quem vai lá com 16 ou 17 precisa, sim, comprovar que finalizou um curso teórico específico.
A taxa de 33 dólares é a única cobrada para o processo inteiro. Achei o preço ótimo, não é nada comparado ao Brasil.
Lá mesmo no DMV eles dão um livrinho com as leis de trânsito da Califórnia para você estudar. Ele está disponível em outras línguas também, como espanhol, chinês, árabe e mais algumas outras (não, não tem uma versão em português). A prova também pode ser feita em outras línguas, e dessa vez o português está disponível! Mas o que adianta ter que estudar em inglês ou espanhol e ter que responder em português? Além disso, quem faz o teste escrito em uma língua estrangeira também tem que passar por uma prova apenas de placas de sinalização.
Fazer a prova teórica
Passar na prova teórica é fácil, basta você ler o livrinho e, se quiser, dar uma olhada nas questões disponíveis no site deles (aqui você encontrar algumas questões que caem nas provas). São apenas 36 questões objetivas, e caso você não passe na primeira, eles te dão mais duas chances! Legal, né? E nem precisa pagar nada a mais por isso, só se você queimar suas três chances — aí sim, é preciso pagar a taxa de 33 dólares novamente.
Foto: Gallery Hip
Eu passei de primeira (desculpa, aí). Meu marido, quando fez a dele, nem encostou no livro e não passou de primeira. Nesse caso, devolveram a prova dele corrigida e ele pode ver quais questões tinha respondido errado, o que ajudou bastante na hora de fazer a outra, já que várias das perguntas da primeira prova reapareceram na segunda. Pois é, é simples assim. Mas atenção: você só tem até as 16:30 horas para fazer o teste escrito. Por isso, eu recomendo agendar a prova para de manhã ou no comecinho da tarde; caso role ~reprovação~ você terá tempo de sobra para tentar de novo.
Fazer o exame de visão
Depois que eu terminei minha prova, fiquei esperando o resultado por uns 15 minutos. Chamaram meu nome, vi que tinha passado, e fui encaminhada para o exame de visão. Eu pensei que ia entrar em uma sala própria, com um médico e tal, mas não — você faz o “exame” no balcão do(a) atendente, mesmo. Na parte superior do cubículo dele(a) tem uma placa grande com letras e números de tamanhos variados (desde gigante até minúsculo). Ele ou ela te pede para tampar um olho e ler uma sequência, depois, para tampar o outro e ler outra sequência. Super difícil e quase reprovei, só que não.
Marcar a prova prática
Depois de passar no exame teórico e de visão, recebi um papel que dizia ser minha carteira de habilitação provisória. Para minha tristeza, aquilo não significava que eu já podia sair dirigindo por aí (ainda bem, né, senão seria meio desastroso). Esse papelzinho me permitia fazer aulas práticas caso eu quisesse, ou dirigir acompanhada de alguém maior que 25 anos e com carteira de motorista válida. E eu tive que treinar, né, gente? Ao invés de pagar por aulas (o que sai em torno de 370 dólares), minha amiga Lili me ajudou e foi corajosa o bastante para deixar eu dirigir o carro dela! Foi ela quem me ensinou como algumas coisas funcionam e me relembrou outras que eu já tinha esquecido há tempos.
Foto Gabriela Klafke – na época de aprendiz
E foi assim que aprendi a dirigir. Achei super legal o fato de não precisar procurar um instrutor licenciado para aprender, basta ter alguém maior que 25 anos ao seu lado, habilitado(a).
Com o papel que me deram nesse dia pude marcar meu teste prático, finalmente. Assim que cheguei em casa, entrei no site e escolhi a data mais próxima. Era dali a duas semanas.
Fazer a prova prática
Esse dia foi tenso. Marquei minha prova para de manhã cedo para ficar livre logo e acabar com o meu nervosismo — eu sou hiper ansiosa, nesse dia meu estômago estava se revirando. Para fazer a prova prática é preciso:
- levar você mesmo um carro — sim, eles não “emprestam” carro aqui. É preciso trazer o seu ou de algum familiar/amigo, ou alugar um;
- apresentar os documentos do veículo;
- provar que o carro tem seguro válido (aqui na Califórnia o seguro é obrigatório)
Depois de apresentar todos esses documentos, me pediram para pegar meu carro e ir para uma fila. Lá, fiquei esperando o outros carros saírem, um a um, até chegar a minha vez de começar a prova. E olha, a espera é a pior parte para mim. Como eu já estava nervosa, 30 minutos se tornaram 30 horas!
Quando chegou a minha vez, um examinador (chamo ele de camponês, porque era um cara de cabelo branco e chapelão de gente que trabalha no campo) chegou e me pediu para pisar no freio, para ele checar se a luz traseira estava funcionando. Depois, ele me pediu para ligar as setas. Pediu também para eu mostrar onde fica o pisca-alerta e o desembaçador de vidros. É comum eles fazerem umas perguntas básicas sobre o funcionamento do carro antes de sairmos e geralmente essa parte é bem tranquila.
Finalmente chegou a hora da parte “real” da prova. Eu já sabia o percurso de cor e salteado — eles usam SEMPRE o mesmo, e uma conhecida nossa já tinha feito a prova e explicado em detalhes (onde para, onde vira, etc) o exame. Minha amiga Lili me ajudou e treinou o percurso comigo por alguns dias.
Eu achei bem fácil — o examinador, do seu lado, vai te dando instruções para virar à esquerda, virar à direita, e coisas assim. Ele ou ela te leva para uma área comercial e outra residencial, para ver se o(a) examinado(a) sabe qual é a velocidade permitida nesses lugares, observa se você olha com cuidado pelo retrovisor quando vai mudar de faixa, se dá sinal, se para no sinal de “pare”, etc. Meu examinador foi anotando tudo em um papel — ele não era de muitas palavras, só ia dando as instruções e tomando nota de tudo.
No final da prova, antes de voltarmos para o DMV, o examinador pediu para que eu estacionasse o carro. Esqueça da baliza super complicada que é exigida no Brasil — aqui, você precisa apenas alinhar o carro meio rente ao meio-fio, sem nenhum carro na sua frente ou atrás. Moleza, né? Eu estava indo bem, até o momento em que ele pediu para eu endireitar o volante e dar uma ré reto. Eu não sei se foi o nervosismo ou se não consegui entender completamente o que ele me falou na hora (ou os dois juntos), mas não consegui endireitar o carro e dar a maldita ré.
Foto: Young Cons
Quando voltamos ao DMV, o ~camponês~ pediu para eu parar o carro. Ele me entregou o papel com o que eu tinha acertado e errado, e apesar de eu não ter quase nenhum erro, ele disse que não poderia me passar porque eu não estacionei direito. Pois é… foi triste. Fiquei mal, chorei, quis me bater, mas não tinha jeito. O negócio era marcar outra prova e, enquanto isso, treinar um pouco mais.
Marquei a outra prova antes de voltar para a casa, para dali a uma semana. Você pode refazer a prova prática mais duas vezes sem precisar reiniciar o processo inteiro, pagando apenas uma taxa de 6 dólares cada vez que precisar fazer o exame de novo.
Durante esse meio tempo, treinei mais e dirigi bastante (até sozinha, o que não é nada muito certo). Mas foi ótimo, porque no dia da prova eu estava bem mais confiante, acho que confiante até demais. Tudo correu muito bem, mas no final da prova, quando eu e o examinador chegamos ao DMV (dessa vez não peguei o camponês), ele me disse:
Do you know what the stop sign means?
It means that you have to stop, eu disse.
So why didn’t you do that?
Ouch. Essa doeu.
(Traduzindo: Você sabe o que a placa “pare” significa, perguntou o examinador. Eu, toda faceira, disse, significa que é preciso parar. E ele me finalizou com um, Então porque você não fez isso?)
Ele me disse que eu não parei completamente nos “pares”, apenas olhei se não vinha carro e segui em frente. Na minha cabeça, eu tinha parado. Mas, enfim, ele relevou e disse para eu prestar mais atenção nisso dali para frente. Bem mais bonzinho que o camponês!
Pegar a carteira provisória
Foto: Gabriela Klafke
Depois de finalmente ter sido aprovada, fui levar o papelzinho da aprovação para a atendente que estava por lá (in your face!, deu vontade de dizer). Ela me deu outro papel que dizia que eu já podia dirigir legalmente, válido por 3 meses, se não me engano. Ela também me informou que minha carteira “oficial”, com foto e tudo mais, chegaria em até duas semanas em minha casa, pelo correio. Demorou mais que isso, mas um dia chegou! A besta aqui ficou toda feliz.
E essa foi a minha saga, pessoal. Espero que esse post seja útil para quem precisar tirar carteira de habilitação aqui, e que tenha matado um pouco da curiosidade que muitos têm em relação ao assunto!
Para finalizar, algumas peculiaridades das leis de trânsito daqui:
- Na Califórnia você pode (e deve) “furar” o sinal vermelho caso vá virar à direita. Basta conferir se não vem carro e ir em frente!
- Nas cidades de Orange County a velocidade máxima permitida é bem altinha, em torno de 80 km por hora.
- Nas freeways, isso pula para 104 km por hora (e aqui é preciso pegar freeway pra tudo, já virei quase uma pilota de fuga).
- Menores de 18 que já tiraram carteira de habilitação só podem dirigir com os pais ou com uma pessoa com 25 anos ou mais, e que tenha habilitação válida. Não é aquele oba-oba que vemos nos filmes.
- Nas freeways (palavra que eles usam para “rodovia”) há uma pista separada no canto esquerdo chamada carpool. Ela é reservada para carros com duas pessoas ou mais e geralmente é bem mais tranquila, servindo de incentivo para o pessoal andar junto ao invés de cada um ir sozinho em seu carro.