Do G1
O Brasil abriga hoje 5.208 refugiados, sendo os colombianos e os angolanos quase metade dos estrangeiros com o status. É o que mostram dados atualizados do Comitê Nacional de Refugiados (Conare), do Ministério da Justiça, obtidos pelo G1 (veja o mapa com todas as nacionalidades).
Os números revelam que os pedidos de refúgio no país têm crescido exponencialmente ao longo dos anos. Em 2013, foram 5.256, ante 566 em 2010. As solicitações aceitas também aumentaram: de 126, em 2010, para 649 no ano passado.
Para o secretário nacional de Justiça, Paulo Abrão, o aumento é decorrente exclusivamente das condições internacionais. “Isso acontece devido ao agravamento da crise no Oriente Médio e dos conflitos nos países africanos e também no nosso continente”, diz.
O representante do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) no Brasil, Andrés Ramirez, concorda que o acirramento de conflitos, como a guerra civil na Síria, é fator fundamental para esse fluxo, mas ressalta também uma presença maior do Brasil no cenário internacional. “As solicitações aumentaram no mundo todo. Além das crises humanitárias antigas, como a do Iraque e a do Afeganistão, em 2011 houve a Primavera Árabe. Problemas na Costa do Marfim, no Mali, na Somália e no Sudão do Sul também foram registrados”, afirma.
O refúgio é um direito de estrangeiros garantido por uma convenção da Organização das Nações Unidas (ONU) de 1951 e ratificada por lei no Brasil em 1997. Segundo o Ministério da Justiça, o refúgio pode ser solicitado por “qualquer estrangeiro que possua fundado temor de perseguição por motivos de raça, religião, opinião pública, nacionalidade ou por pertencer a grupo social específico e também por aqueles que tenham sido obrigados a deixar seu país de origem devido a uma grave e generalizada violação de direitos humanos”. Com esse status, as pessoas passam a ter os mesmos direitos dos habitantes do país.
As entrevistas com os estrangeiros são feitas por técnicos, que fazem um relatório atestando ou não sua elegibilidade. A decisão final é tomada em reunião plenária do Conare. Em 2013, pela primeira vez o número de solicitações aprovadas foi maior que o de negadas – 649 contra 636.
Nacionalidades
Atualmente, há refugiados de 79 nacionalidades vivendo no Brasil. O maior grupo é formado por colombianos: 1.154 no total. Desses, 360 são reassentados, isto é, estrangeiros que conseguiram refúgio em um país e, por alguma circunstância, precisaram migrar para um terceiro.
Refugiados sírios fazem aula de português em
São Paulo (Foto: Gabriel Chaim/G1)
O Brasil é uma das poucas nações que participam do programa de reassentamento do Acnur. Segundo o Ministério da Justiça, no caso dos colombianos, o objetivo é cooperar com o Equador na busca por uma solução para os mais de 55 mil colombianos refugiados naquele país. O compromisso de ajuda foi assumido pelo Brasil diante de organismos internacionais.
O representante do Acnur afirma que houve mudanças importantes na Colômbia recentemente, com o reconhecimento por parte do governo da responsabilidade em crimes cometidos nos últimos 50 anos de conflito, a reparação das vítimas das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e a restituição de terras. “O início do diálogo de paz é importante, mas os colombianos continuam deixando o país porque não têm confiança de que o processo vai dar certo. Há muito ceticismo e a maioria acha que a situação não vai mudar radicalmente”, diz Ramirez.
1.154 é o total de colombianos refugiados, o maior grupo no país.
Segundo ele, um acordo firmado entre países do Mercosul possibilita que colombianos – e também argentinos, paraguaios, uruguaios, chilenos e peruanos – solicitem residência permanente no Brasil. Por essa razão, muitos optam por não pedir o refúgio, já que existe essa possibilidade.
Os angolanos aparecem na segunda posição do ranking de refugiados no Brasil, com 1.062 pessoas. Esse número, no entanto, deve diminuir gradativamente, pois houve um pedido do Acnur para que fosse cessada a condição de refugiados aos habitantes que deixaram o país africano durante a guerra civil (que durou quase três décadas e foi encerrada em 2002), em razão de a situação já ter sido estabilizada. O processo ainda está em curso.
“Como medida complementar, foi oferecida a possibilidade de eles continuarem no território nacional como residentes permanentes, por cumprirem todos os requisitos legais. Isso foi feito para que aqueles indivíduos que possuíam suficiente integração cultural e econômica por longos anos pudessem receber uma solução duradoura. E foi dada a oportunidade para os que tinham interesse em voltar fazerem isso, a partir do exercício de sua própria autonomia”, afirma o secretário nacional de Justiça, Paulo Abrão.
Soldados da ONU patrulham a cidade de Goma, no leste da República Democrática do Congo, após ataque com um morto e vários feridos, em 2012
(Foto: Junior D.Kannah/Arquivo AFP)
No caso de novas solicitações de angolanos, Abrão diz que o Conare faz uma análise “criteriosa e individualizada” para identificar se há um fundado temor de perseguição particular.
O terceiro maior grupo de refugiados no Brasil é formado por congoleses, que ainda convivem com uma crise humanitária em consequência de embates entre governo e opositores do presidente Joseph Kaliba. Ao todo, são 617 indivíduos com esse status reconhecido em território nacional.
Já os sírios ocupam a quarta posição do ranking. Dos 333 refugiados, 284 conseguiram o status no ano passado, após uma escalada da violência no país árabe, que registra em três anos mais de 150 mil mortos nos conflitos entre rebeldes e forças do regime do presidente Bashar al-Assad.
Pedidos
Do total de pedidos de refúgio feitos ao Brasil no ano passado, 2.242 (43%) foram de africanos. Outras 2.039 solicitações (39%) partiram de asiáticos. A maioria ainda não foi analisada.
Bangladesh lidera a lista de nacionalidades com o maior número de pedidos de refúgio em 2013, com 1.837. Apenas uma pessoa proveniente do país, no entanto, teve a condição reconhecida no ano passado. O Senegal aparece logo atrás, com 961 pedidos, sendo que apenas quatro habitantes conseguiram o status em 2013.
Bengalis sem documentação no Paraná; esses estrangeiros são líderes em pedidos de refúgio, mas a maioria não se enquadra no status
(Foto: Polícia Rodoviária Estadual/Divulgação)
De acordo com o secretário nacional de Justiça, a maioria dos bengalis e senegaleses entra no Brasil por razões econômicas, que não se enquadram no refúgio. “Eles têm utilizado o expediente do refúgio porque têm encontrado excesso de burocracia na solicitação de visto prévio como imigrantes comuns. Quando é feita essa solicitação de refúgio, as convenções internacionais estabelecem que é preciso conceder a autorização provisória de permanência. Isso porque há um princípio da proteção imediata, até o julgamento do mérito”, explica Abrão.
Apesar de a entrada de haitianos ter triplicado na fronteira, eles também não são reconhecidos, em sua maioria, como refugiados. Para eles, há um visto especial humanitário, que permite que os habitantes do país, assolado por um terremoto em 2010, permaneçam no Brasil.
Entre as cidades do país que mais receberam pedidos de refúgio em 2013, São Paulo é a campeã, com 1.092 solicitações. Brasília recebeu 745, Guaíra (PR) – na fronteira com o Paraguai – teve 487 e Epitaciolândia (AC) – na fronteira da Bolívia e também perto do Peru –, 367.
Entre os estados, São Paulo também lidera, com 1.204 pedidos. O Paraná é o segundo com mais solicitações: 1.088.
Comparações
Apesar do aumento de concessões de refúgio no Brasil, o número de estrangeiros reconhecidos ainda é pequeno se comparado ao de outros países.
O Paquistão, que tem atualmente a maior população de refugiados do mundo, abriga cerca de 1,6 milhão de estrangeiros. E, no Líbano, quase um quarto da população é formada por refugiados sírios (1 milhão dos 4,4 milhões de habitantes).